HEMODINÂNICA À BEIRA DO LEITO

Serviço de Cirurgia Cardiovascular — Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo
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MONITORIZAÇÃO HABITUAL — INDICAÇÕES

 

Os avanços da monitorização hemodinâmica à beira do leito ofereceram ao intensivista uma das poucas situações em Medicina em que nem sempre o quadro clínico é soberano. Essa situação ocorre na apresentação das diversas graduações dos estados de choque, em sua mais variada etiologia. Isso começou a ser observado após 1970, quando a introdução do cateter de Swan-Ganz(1) possibilitou o melhor entendimento das alterações fisiopatológicas do choque e a adequação de seu tratamento. Inicialmente, esse cateter foi utilizado apenas em pacientes com infarto agudo complicado do miocárdio, para se obter as medidas de pressão da artéria pulmonar e de pressão de oclusão do capilar pulmonar. Após 1972, quando a colocação de um sensor térmico nesse cateter possibilitou a medida do débito cardíaco, percebeu-se que parâmetros como boa pressão arterial, boa diurese, bom nível de consciência e até a avaliação da perfusão tecidual periférica não eram suficientes para se excluir eventual baixo débito cardíaco; assim, sua indicação se expandiu.

Desse modo, atualmente, cerca de dois milhões desses cateteres vêm sendo utilizados, por ano, nos Estados Unidos e cerca de 300 mil na Europa(2). Seu uso destina-se à obtenção das medidas de débito cardíaco por termodiluição intermitente a frio(3), à temperatura ambiente e de forma contínua(4), da medida da fração de ejeção do ventrículo direito por meio de um cateter chamado de resposta rápida(5), que possibilita o cálculo do volume diastólico final desse ventrículo, e da medida da saturação venosa mista de oxigênio por meio de fibra óptica, que é um dado tão ou mais importante que o conhecimento do próprio débito.(6)

No pós-operatório de cirurgia cardíaca, sob o ponto de vista teórico, quase todos os pacientes teriam indicação de monitorização hemodinâmica invasiva com o uso de cateter de artéria pulmonar, considerando-se que parâmetros clínicos não excluem o baixo débito cardíaco e que este deve ser sempre o primeiro diagnóstico quando a convalescença não for a habitual. É aceita como contra-argumento a essa premissa a afirmação verdadeira de que, na maioria das vezes, a desadaptação, no caso de a função ventricular prévia ser boa, se deva apenas a ajustes na pré e na pós-carga, e de que os pacientes que se desligaram da circulação extracorpórea com facilidade estão, em sua maioria, aptos a prosseguir no pós-operatório sem dificuldades. Assim, o reduzido benefício potencial aliado a eventuais complicações e ao alto custo não justificam o uso de cateter de Swan-Ganz em todos os pacientes submetidos a essa cirurgia(7). Nessa situação, são candidatos à monitorização invasiva os pacientes com disfunção ventricular esquerda, os pacientes que não respondem ao ajuste da volemia, com necessidade de doses elevadas de drogas vasoativas, ou quando há evidência de infarto transoperatório, sobretudo de parede anterior do ventrículo esquerdo. Essa é uma situação clínica grave, com mortalidade elevada, que deve ser encarada com cautela; portanto, a monitorização invasiva torna-se fundamental.

A monitorização invasiva com cateter ainda está indicada nos casos de instabilidade hemodinâmica aguda ou muito provável, como no infarto do ventrículo direito, para ajuste da volemia, resposta inadequada da reposição volêmica e otimização de drogas vasoativas. Também está indicada no diagnóstico diferencial de algumas complicações do infarto, como insuficiência mitral aguda, comunicação interventricular ou tamponamento cardíaco pós-ruptura do ventrículo esquerdo. No tamponamento cardíaco no pós-operatório de cirurgia cardíaca, o diagnóstico deve ser baseado em outros parâmetros e exames complementares, a menos que o paciente já esteja monitorizado pelo cateter de artéria pulmonar; nessa situação, o que chama a atenção é a clássica equalização das pressões. É também adequado que pacientes que necessitem de suporte mecânico tenham seus parâmetros hemodinâmicos conhecidos.

A monitorização com cateter de artéria pulmonar também é recomendada no chamado choque distributivo, com vasoplegia secundária à reação inflamatória que se instala nos pacientes politraumatizados, em sepse, com grandes queimaduras e na notória vasoplegia secundária ao uso de protamina no pós-operatório de cirurgia cardíaca. Esse quadro, possivelmente, resulta da liberação de citocinas, como fator alfa de necrose tumoral e interleucinas. Esses mediadores, que possuem potentes efeitos vasoativos, produzem severa lesão tecidual e sua liberação guarda relação com o tempo de perfusão e de pinçamento aórtico. Esse quadro caracteriza-se pela diminuição da pós-carga por queda da resistência vascular sistêmica (índice de resistência < 1.200 dyn/seg/cm-5m²).

Está indicada, também, no diagnóstico diferencial entre edema pulmonar cardiogênico e não-cardiogênico, como ocorre nos pacientes com síndrome de estresse respiratório, e para diagnóstico e acompanhamento da hipertensão pulmonar secundária a fenômenos embólicos, como embolia de líquido amniótico ou gordurosa.

 

COMPLICAÇÕES DO USO DO CATETER DE ARTÉRIA PULMONAR

 

Apesar da ampla utilização desse cateter por quase todo o mundo, não se trata de um método isento de complicações.

Atribui-se mortalidade relacionada ao uso desse cateter de 0,02% a 1,5%(8), o que representa valor extremamente alto para um procedimento que se propõem ser estritamente diagnóstico.

As complicações relacionadas ao uso do cateter de artéria pulmonar iniciam-se com sua colocação (punção arterial, pneumo e hemotórax, arritmias, lesões valvulares e de artéria pulmonar, e perfurações no ventrículo direito) e se mantêm durante seu uso (infecções, fenômenos embólicos e fragmentação do cateter). Mas o tratamento inadequado por má coleta ou interpretação dos dados talvez seja a complicação mais freqüente. A infecção no local da punção está presente em aproximadamente 15% dos pacientes, mas a endocardite está relacionada ao uso do cateter em menos de 1,5% dos casos. A rotura de artéria pulmonar apresenta incidência de 0,001% a 0,47%(9) dos pacientes que utilizaram o cateter de Swan-Ganz, e há vários relatos da formação de pseudo-aneurismas dessa artéria na literatura(10).

 

OBTENÇÃO DOS DADOS COM O CATETER DE ARTÉRIA PULMONAR

 

Para segurança na conduta a ser tomada, é preciso que haja o menor número de variáveis possíveis interferindo na obtenção dos dados, como boa qualidade do traçado, adequada calibragem do monitor de pressão e observação da posição do cateter. Mesmo assim, inúmeros trabalhos demonstram margem de erro que varia de 15% a 33% na obtenção dos valores numéricos da pressão do capilar pulmonar(11) e uma margem de erro ainda maior, que pode chegar a 50% na obtenção da medida do débito cardíaco(11).

Medidas pouco confiáveis são obtidas na presença de grandes atelectasias, broncospasmos, "shunt" intracavitário e fibrilação atrial(12); porém, ao contrário do que se imagina, valores de pressão expiratória final positiva de até 10 cmH2O não alteram ou alteram muito pouco as pressões da artéria pulmonar(13). Felizmente, hoje, com a possibilidade da mensuração do débito cardíaco de forma contínua, da oximetria venosa também de forma contínua e da fração de ejeção do ventrículo direito, essa margem de erro foi substancialmente reduzida(14) (grau D, nível de evidência III).

Quanto à posição do cateter, o consenso é que deva permanecer na zona III de West(15), onde o fluxo sanguíneo é ininterrupto e as medidas de pressão não sofrem interferência das pressões alveolares.

Outra preocupação no que concerne ao uso do cateter de artéria pulmonar é o treinamento dos intensivistas na obtenção e na interpretação dos dados. Em estudo realizado no Canadá e nos Estados Unidos(16), foi demonstrado que somente 59% dos intensivistas interpretaram corretamente a pressão capilar em um traçado de pressão; em outro estudo realizado na Suíça, França e Bélgica, em 1997(2), 54% dos médicos que trabalham na terapia intensiva também não puderam interpretar corretamente o mesmo traçado e 68% não puderam explicar a importância da saturação de oxigênio na interpretação do "status" hemodinâmico. O que parecia óbvio quanto aos melhores resultados dos tratamentos instituídos, com base em dados numéricos e não subjetivos, nem sempre se comprova. Alguns trabalhos chegam a reportar 50% de erros de interpretação dos dados obtidos pelo cateter(2,16); outros, variação da terapêutica de 50% após a monitorização, mas não deixam claro se esse novo tratamento foi mais efetivo. Stainbrub e colaboradores(17) demonstraram 45% de mudança na terapia após o uso do cateter, mas 16% dessa nova terapia indicada pelo cateter foram considerados inapropriados.

 

CATETER DE ARTÉRIA PULMONAR MELHORA O PROGNÓSTICO?

 

Grande número de cardiologistas e intensivistas acredita que o cateter de artéria pulmonar melhora o prognóstico. Consideram esse tipo de monitorização mais do que útil, mas imprescindível para orientar o tratamento de grande número de pacientes graves. O que preocupa, no entanto, é o número crescente de publicações de trabalhos retrospectivos demonstrando mortalidade maior nos pacientes que se valeram desse tipo de monitorização, chegando alguns autores a clamar pelo que chamaram de "moratória" do cateter de Swan-Ganz(18). Outros, como Naylor e colaboradores(19), chamam a atenção para seu elevado custo e a grande possibilidade de iatrogenia. Em 1996, um grande estudo multicêntrico, realizado nos Estados Unidos (16 unidades de terapia intensiva), concluiu ser a sobrevida mais baixa, os custos mais elevados e o período de internação dos pacientes que utilizaram cateter de Swan-Ganz(20) mais prolongado. Steinbrub e colaboradores(17) demonstraram, em cirurgia de revascularização miocárdica, um grupo de 194 pacientes, dos quais 32% foram monitorizados com cateter de artéria pulmonar e os 68% restantes, apenas com medida de pressão venosa central. A mortalidade foi muito semelhante e houve tendência de maior número de complicações no grupo com cateter de artéria pulmonar. O tempo de permanência na Unidade de Tratamento Intensivo, o tempo de intubação traqueal bem como os custos foram maiores nesse grupo. Vale lembrar que os pacientes, nesse trabalho, eram considerados de baixo risco cirúrgico nos dois grupos.

A dúvida sobre a melhora do prognóstico com o uso do cateter de artéria pulmonar foi tão grande que motivou a realização de um congresso, para que se obtivessem respostas com os graus e níveis de evidência com o uso do cateter de artéria pulmonar nas diferentes situações clínicas(14). Na cirurgia cardíaca considerada de baixo risco, a resposta a essa questão foi Não, com graduação C, ou seja, corroborado apenas por trabalho nível II (pequenos trabalhos randomizados com resultados incertos; risco moderado e alto de falso positivo e/ou falso negativo); na mesma cirurgia considerada de alto risco, a resposta foi Incerto, também com graduação C.

Apesar de todos esses problemas apontados e das dúvidas que essa vasta literatura provoca, não é cabível que se pense em retirar o intensivista, aliado tão poderoso, que, com mais de trinta anos de convívio, vem nos convencendo de sua importância. Quando a interpretação criteriosa dos dados leva à mudança terapêutica e o paciente tem resposta apropriada a essa nova conduta, seguramente ele terá melhor prognóstico. Talvez o papel do intensivista seja o de definir qual paciente realmente vai se beneficiar da monitorização invasiva.

 

APERFEIÇOAMENTO DO CATETER DE ARTÉRIA PULMONAR

 

Além dos inúmeros problemas mencionados na monitorização invasiva, havia necessidade de uma equipe de terapia intensiva que não somente soubesse interpretar os dados, mas pudesse obtê-los a partir do cateter e do monitor. Isso representava desvantagens óbvias, como não-obtenção desses valores em tempo real e manipulação excessiva do cateter, com perda de tempo e risco de contaminação. A partir de 1992, foi desenvolvida a medida contínua do débito cardíaco(21), utilizando-se as variações de temperatura como indicador, com pulsos térmicos de pequena energia enviados pelo computador e captados por um filamento térmico de 10 cm, localizado a 14 cm da ponta do cateter. As variações da temperatura do sangue em contato com esse filamento, que se aquece ou se esfria dependendo da velocidade do fluxo, são sentidas por um termistor localizado na ponta do cateter. Esse método parece apresentar maior sensibilidade e, portanto, maior acurácia que o método clássico de infusões de cristalóides(22).

 

SATURAÇÃO VENOSA MISTA DE OXIGÊNIO

 

O valor numérico obtido com a mensuração do débito cardíaco não é um dado que deva ser analisado isoladamente. Essa medida guarda relação linear com a saturação venosa de oxigênio, desde que seja mantida a demanda metabólica. Quando a saturação arterial de oxigênio é mantida em níveis elevados, a extração é inversamente proporcional à saturação venosa(23). A vantagem de se medir a saturação venosa de oxigênio está no fato de que seus valores incidem sobre a porção inclinada da curva de saturação de hemoglobina, na qual a relação entre pressão venosa e saturação venosa de oxigênio é linear. Ao se incorporar duas fibras ópticas na extremidade do cateter de artéria pulmonar, espectros de luz infravermelha são transmitidos por uma das fibras e atingem os glóbulos; pela segunda fibra, a quantidade de luz que retorna está relacionada com a quantidade de oxiemoglobina "versus" hemoglobina desoxigenada no sangue venoso. Então, um fotodetector no módulo, ligado a um microprocessador, analisa a relação entre a luz refletida e a luz absorvida, calcula e demonstra a saturação venosa de oxigênio de forma contínua(6). As potenciais causas de variações na saturação venosa podem ser encontradas pela análise da equação de Fick. Desse modo, o consumo de O2, o conteúdo arterial de O2, que, por sua vez, é dependente da concentração de hemoglobina, e o débito cardíaco são fatores que alteram a saturação venosa de oxigênio.

Estudos clínicos sugerem que, em caso de choque cardiogênico, o emprego da saturação venosa como índice de prognóstico e terapêutica pode ser útil; porém, em outras situações clínicas, ainda carece de sensibilidade e especificidade(24).

 

OUTROS MÉTODOS DE AVALIÇÃO HEMODINÂMICA

 

Tonometria gastrointestinal e perfusão tecidual

A rotina básica de tratamento dos doentes na terapia intensiva visa a proporcionar, de forma otimizada, o conteúdo arterial e a oferta global de oxigênio aos tecidos de forma adequada a suas necessidades. Apesar disso, ainda é alta a mortalidade dos pacientes que apresentam graves distúrbios circulatórios, porque permanecem falhas por não se considerar as diferenças regionais circulatórias e diferentes demandas de oxigênio(25). Fica claro, desse modo, que a monitorização da perfusão sanguínea regional é fundamental, por possibilitar intervenção precoce nos eventos fisiopatológicos que produzem essa elevada mortalidade. O único método de monitorização disponível com essa capacidade é a tonometria gastrointestinal, que já mostrou ter grande impacto no tratamento de doentes graves(26). Essas idéias já se faziam presentes no final da década de 50, quando Lilehei(27) demonstrou que a perfusão intestinal com sangue de animais normotensos reduzia muito a mortalidade por choque hemorrágico produzido em cães, o que não ocorria com a perfusão hepática ou cerebral.

Por meio da tonometria gastrointestinal, obtém-se a medida da concentração parcial de gás carbônico (PCO2) na mucosa do tubo digestivo. Isso porque o PCO2 da mucosa é o produto do equilíbrio entre a produção do CO2 dos tecidos e de sua remoção, que depende, em última análise, da circulação regional; desse modo, pode-se aferir indiretamente essa perfusão. Essa medida costuma ser abreviada como PgCO2, que, por facilidade técnica, habitualmente é realizada apenas na mucosa gástrica. A técnica consiste, basicamente, na inserção de uma sonda gástrica modificada, chamada tonômetro. Os valores da PgCO2 podem ser obtidos por meio da injeção de solução salina para preenchimento do balão. Nesse método, mais antigo, manual, e que oferece aferição de modo intermitente, o cálculo do pH intramucoso era utilizado como índice de perfusão regional; postulava-se que, em caso de acidose, estaríamos diante de isquemia regional esplâncnica. Hoje, alguns trabalhos invalidam seu uso clínico isolado como guia terapêutico(28). Desse modo, passou-se a utilizar um método automatizado, com ar ambiente para preenchimento do balão, obtendo-se o chamado PgCO2 praticamente de forma contínua, por meio do qual é realizado o cálculo de sua diferença e da pressão parcial de gás carbônico do sangue arterial (PCO2). Então: PCO2gap = PgCO2 - PaCO2.

De maneira geral, pode-se considerar que a PCO2gap > 5 mmHg demonstra hipofluxo regional da mucosa gástrica.

Recomenda-se um período de aproximadamente quatro horas de jejum antecedendo essas medidas, para aumentar sua confiabilidade.

Em virtude da relação entre PgCO2 e perfusão sanguínea, a tonometria tem sido utilizada para estudar procedimentos cirúrgicos cardiovasculares(29); porém, seus valores normais não garantem que a oferta de oxigênio esteja adequada à demanda metabólica tecidual, pois a tonometria está bem associada ao fluxo sanguíneo e não aos índices de oxigenação.

 

Doppler transesofágico

Esse método de avaliação do débito cardíaco de forma contínua foi utilizado pela primeira vez em 1975(30); porém, as medidas realizadas na aorta descendente não correspondem exatamente ao débito cardíaco, o que obriga à necessidade de um fator de correção(31). Já se verificou que o débito aórtico é cerca de 14% a 18% mais baixo que o débito cardíaco(31).

Embora tenha sido demonstrada boa correlação entre os valores obtidos com esse método e os obtidos por termodiluição(32), sua utilização não é freqüente nas unidades de terapia intensiva, provavelmente pelo grau de investimento financeiro necessário, pelo desconforto do paciente, pela necessidade de treinamento adicional do intensivista, e pela necessidade de utilização de tabelas para se inferir o débito cardíaco.

 

Bioimpedância elétrica torácica

Este método de avaliação do débito cardíaco baseia-se na aplicação de corrente alternada de alta freqüência (70 kHz) e baixa energia (2,5 mA) sobre o tórax, por meio de um sistema tetrapolar de eletrodos posicionados na base do pescoço e do tórax, criando-se um campo eletromagnético. As alterações da velocidade do fluxo e do volume de sangue na aorta promovem mudanças proporcionais na condutividade elétrica, sendo, então, essa informação enviada e processada por um microcomputador, o que permite a aferição do débito cardíaco.

O tempo de intervalo sistólico tem sido medido para avaliação do volume diastólico final e da fração de ejeção do ventrículo esquerdo(33, 34), na tentativa de se avaliar a pré-carga desse ventrículo. Essa técnica, embora sendo não-invasiva, contínua e de relativo baixo custo, tem baixa aplicação em terapia intensiva, por sofrer interferência de inúmeras variáveis muito freqüentemente encontradas em pacientes internados nessas unidades, como aumento da atividade adrenérgica em pacientes com choque cardiogênico, infarto agudo do miocárdio, hipovolemia, insuficiência cardíaca grave e hipertensão arterial sistêmica(35). Também tem se mostrado método de baixa confiabilidade em presença de bloqueio de ramo esquerdo, insuficiência aórtica e septicemia(35, 36).

 

Outros métodos de avaliação hemodinâmica

Um método já consagrado para aferição da fração de ejeção do ventrículo direito é o uso de outro cateter, que possui dois eletrodos intracavitários. Um desses eletrodos é colocado no ventrículo direito e outro na artéria pulmonar, com orifícios em sua porção no átrio direito, os quais levam a mistura da solução de cristalóide gelada ao termistor de resposta rápida. O cálculo da fração de ejeção do ventrículo direito é derivado da curva de decaimento térmico, a exemplo do cateter de Swan-Ganz.

Outro método que vem sendo testado para avaliação do débito cardíaco é o chamado PICCO ("pulmonary intraarterial continuous cardiac output"), que consiste na colocação de dois cateteres, um em veia subclávia ou jugular e outro na artéria femoral. Este último possui um filamento termossensível, que, conectado a um computador, estima a função ventricular. Tem a proposta de ser um método de fácil manuseio e baixo custo, porém perde em sensibilidade se o débito cardíaco for baixo.

Recentemente, também, vem sendo testada uma técnica simples e não-invasiva para estimar a gravidade dos estados de choque circulatório. Essa técnica é a capnometria sublingual (PslCO2), cujos resultados preliminares parecem promissores(37).

 

CONCLUSÕES E OBSERVAÇÕES

 

Já há muito que a Unidade de Terapia Intensiva deixou de ser um local apenas de observação de pacientes potencialmente graves, com impressões subjetivas baseadas unicamente na experiência do médico assistente. Alguns trabalhos demonstraram que a porcentagem de acurácia clínica na suposição das pressões no território pulmonar e índice cardíaco variou de 42% a 44%(38). Com o conhecimento de que os parâmetros clínicos nem sempre expressam a realidade do quadro hemodinâmico, o diagnóstico baseado em dados numéricos que podem ser obtidos à beira do leito aumenta sobremaneira a confiança no tratamento instituído.

Embora grande parte da literatura seja enfática ao afirmar que o uso do cateter de Swan-Ganz não altera a evolução dos pacientes graves, decretar sua "moratória" seria retirar a confiança que esse poderoso aliado traz aos intensivistas há mais de trinta anos no diagnóstico, e deixar de oferecer um tratamento mais adequado ao grupo de sobreviventes.

No pós-operatório de cirurgia cardíaca, sobretudo na presença de disfunção ventricular prévia, infarto trans-operatório ou dificuldade do desligamento da circulação extracorpórea, sua utilização é fundamental.

A busca incessante por um método de avaliação hemodinâmica ideal vem proporcionando o surgimento de inúmeros métodos não-invasivos. O grau de confiabilidade desses procedimentos, porém, vem sendo questionado de modo intenso na literatura(39). Além da confiabilidade, o método chamado ideal deve fornecer dados de maneira contínua, capazes de sugerir alterações na terapêutica, produzindo mudanças na evolução e no prognóstico. Deve ser de fácil manuseio pelo grupo médico e paramédico, e os dados devem ser informados de maneira direta, e não por meio de cálculos. Deve, ainda, ser de fácil instalação, baixo custo e baixo índice de complicações.

Sob esse prisma, ainda distante desse panorama, cabe ao intensivista escolher qual o melhor método e qual paciente deve se beneficiar da monitorização invasiva, levando em consideração o grau de experiência na obtenção e, sobretudo, na interpretação dos dados encontrados.

O desenvolvimento da monitorização hemodinâmica tem seus alicerces plantados no desenvolvimento simultâneo do conhecimento da fisiologia da perfusão tecidual e vice-versa. Provavelmente o futuro próximo nos reserva a obtenção da monitorização ideal; porém, por enquanto, a melhor interpretação dos dados obtidos com o cateter de Swan-Ganz e da saturação venosa mista de oxigênio, se possível associada a tonometria gastrointestinal, é o que se tem de mais confiável.

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DANTE FANGANIELLO SENRA , SERGIO ALMEIDA DE OLIVEIRA